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Um perfeito dia de performance

por Juliana Thiré de Negreiros



Foto: Filipe Felix. Registro de FOGO QUEMA FOGO no Ateliê Desterro.


Uma hora antes da apresentação, um acidente de carro em frente ao teatro.

Nosso vizinho Dark, que aceitou fazer a porta de 14h30 as 16h30 por 50 reais, chegou. Dei um radinho na mão dele, toda feliz que não precisaria gritar pela janela, e pedi que me dissesse quando fossem chegando as pessoas. Com a rua movimentada, Dark esqueceu de ligar o radinho e no primeiro casal lá estava eu, da janela:


- Dark!!! - a rua inteira olha pra cima - Aquele casal tá perdido!!! - Nossa porta ainda não tem número.


Lá em cima, no hall já abarrotado de gente, animada com a chegadas queridas, eu disse, mais baixo:


- Podia entrar de 14:30 às 16:30! Mas não! Chegam todos juntos às 16:40!

- Mas chegamos! - Respondeu a tia da artista.


Dani, artista do dia junto com Gab, me pediu para ser referência de tempo durante a apresentação - que eu andasse de janela em janela, de 10 em 10 minutos, pra eles saberem quanto tempo estava durando a coisa. Impossível! Foi só Dani e Gab começarem a gritar que todo o público se encurralou para o lado das janelas, bloqueando totalmente a passagem.


Eu do hall olhava pra baixo a vizinhança assustada tirando o telefone do bolso.

Na plateia, dois menores de idade um pouco entediados, um deles meio dormindo. Jovens concentrados nas veias dos artistas saltando, na poça de suor e saliva que se formava. Amigas da mãe da artista com cara de que estavam pensando: por que as cadeiras estão todas empilhadas e a gente sentado no chão?

No primeiro silêncio (são 3 momentos de silêncio em 30 minutos), a prima da artista deixa escapar em voz alta:


- É só isso?!


A performance é sonoramente hipnótica. Constrangedora no melhor sentido. No segundo silêncio, a prima decepcionada se arrasta pelo chão até a tia, fala alguma coisa no ouvido, levanta e vai embora com a cara amarrada. As pessoas todas que foram assistir faziam extremo silêncio nos três momentos de silêncio, e barulhos alívios tosse tênis bufo espirro posição calor sede comentários contemplativos conversas paralelas, quando os artistas voltavam a gritar.

Depois dos aplausos:

- Mas você não era dançarina? - Lucília falou pra Gab que falou pra mim - Achei que ia ver uma peça de dança.

Lucília de Assis! Grande atriz; levou a família menos Dora. Deixou uns 3 panfletinhos da peça dela, da Não-Peça, que acontecerá nos dias 17, 18 e 19 de março no CCJF.


Gab foi tomar um banho no banheiro quebrado. Na torneirininha sem maçaneta um alicate pendurado. Tomou o banho mas não conseguiu fechar.


No Bar do Gatão, com o karaokê nas alturas, um moço encachaçado dormia sentado, deixando 2 pastéis esfriando.


Um outro moço, esperando sua quentinha, fez que ia roubar um pacote de biscoito e a gente conversou que ia pagar pra ele.


Antonio e Guilherme - o casal de Maricá - identificaram a árvore que bate nas janelas do espaço. Graviola! Guilherme disse que vai trazer seu grupo de canto-coral.

Comentei com Nina sobre a Academia das Atrizes - projeto novo que vai preparar o corpo de baile pro Débora Blocho (carnaval 2024). Fechou a cara na hora quando eu disse que o nome foi inventado na companhia de um amigo que ela tá brigada.


Diana, amiga da Bebel mãe de Gab, disse que vai fazer uma festa aqui chamada “inimigos do fim”. Gab disse que ela nem é tão inimiga do fim assim.


Na volta, eu e Filipe animados pra colocar esquetes em cartaz de terça a domingo na hora do almoço - como o Teatro do Saara fazia com ingresso a R$3,00 até que faliu. O Crime do Lavradio e A Buceta Mágica - imagina o cartaz. Quero que tenha acidente de carro na porta todos os dias.


O caminho da expressão é como entrar num labirinto

em cujo coração jaz a pérola de alto preço O medo, a crueza

A imprevisibilidade cortando um pedaço maior de vida pra si mesma


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