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Sereias do asfalto, do palco, da vida e dos sonhos

por Quitta Pinheiro




Capa do single "Oração", de Linn da Quebrada, 2019




Olá leitores!

Sejam bem-vindas, bem-vindes e bem-vindos a esta coluna de boas e incômodas abordagens!


Bom, esta travesti de 25 anos que vocês estão se propondo a ler, ouvir e quem sabe acompanhar, já tem uma grande trajetória que será contada por fragmentos em cada edição dessa revista. Já saibam: ler uma travesti é ler a falha de tudo que é construído enquanto ser. Nem digo como ser-humano, pois essa parte, a cisgeneridade, a heteronormatividade, a esperada masculinidade e a branquitude, por boa parte dos últimos tempos, tenta destruir e seguirá tentando. Com isso, me comunico dessa forma para que o processo de entenderem que nós não somos a falha, torne em vocês uma nova e - talvez novamente - uma antiga verdade.


Nossa existência é realidade antes de ser imposto o que foi construído sobre o que somos. Dá um Google, tenha uma troca construtiva e uma escuta efetiva com as minhas irmãs, principalmente as que buscam resgatar esse histórico que afirma as nossas vidas que sim, são reais. Peço licença as minhas mais velhas, as que se foram e as que seguem se ferindo diariamente com o mantra de quê: é direito e necessidade nossa ser o corpo-presença em todas as possibilidades de vida, de novas perspectivas da estrutura social, de pensamentos que colaboram para evolução de mundo e de positivo incômodo em lugares públicos ou privados.


Priorizar a permanência ou a ocupação temporária de existências trans, em todos os espaços, é importante, sabia?


Nós somos a chance de uma nova era que se inicia no momento em que rompemos a resistência que criaram para ser quem somos, essa batalha pessoal que quando vencida, ressignifica e dissolve tudo e todos os padrões estabelecidos como único caminho. Seremos por um longo tempo, no país que mais mata pessoas trans e travestis, intituladas como as primeiras sempre quando conquistarmos um lugar de liderança, de tomada de decisão, de poder influenciador, pelo simples fato de compreender na ferida que o acolhimento e a empatia são fundamentais para um novo amanhã. Nossa presença e fala sempre dissemina as transformações.


A resposta que está sendo comunicada para a estrutura que nos pressiona, apenas e somente o direito ao nada, com a possibilidade de estar aqui lançando esta coluna, como também de minhas irmãs estarem famosas trabalhando com suas produções artísticas, de serem advogadas, acadêmicas, políticas, empreendedoras e tudo que somos, queremos e sonhamos em atuar e ser. Linn da Quebrada, essa intérprete, cantora, atriz, falha e travesti, se propõe a ser intermédio dessa resposta a nível nacional e já se torna o novo olhar para aqueles que escondem e omitem em admitir que sim, somos o que não esperam mas também somos semelhantes podendo escolher ter uma vida comum ou em ser grandes personalidades. O direito à tudo e principalmente a escolha das nossas direções já é posse nossa. Estamos e seguiremos organizadas em defender as nossas vidas. Somos constantemente a força e a defesa de continuarmos vivas!


A identidade travesti é latino-brasileira, usada de forma pejorativa para nos diminuir e precisa urgentemente ser respeitada com dignidade por carregar culturalmente quem somos. Esta responsabilidade de proteger e assegurar as existências de pessoas trans e principalmente travestis, deve ser de toda a população brasileira.


O tempo voa e com ele a lei do retorno faz jus ao que se espera. Já temos a certeza e buscamos assegurar a nossa liberdade de ser processo, para concretizar que toda matéria se finda, mas toda história é eterna.


Para as minhas, os meus companheiros homens trans e também as existências não-binarias, fecho esta coluna sugerindo que dêem o play na canção de Lina Pereira chamada "Serei A", estimulando nessa leitura um momento de leveza, cantando o mais alto pra si, o seguinte trecho: "Mas não se esqueça, levante a cabeça. Aconteça o que aconteça, continue a navegar, continue a atravessar, continue a travecar!"





Dedico minha primeira coluna a todas que colaboraram para que eu esteja viva até aqui, fazendo parte da construção e processo do ser que me torno e podendo enxergar a trilha que me impulsiona a continuar. E aquelas que tiveram suas vidas e sonhos interrompidos, capinando a grama que piso e passando o bastão. Todas permanecem vivas em cada uma de nós, as tornando sempre presentes.


Somos eternas! Ninguém morta, todas vivas!

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