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Bem vindos ao condomínio Brasil

por Gustavo Gomes



Você que entrou aqui se tornou, nesse momento, um morador do condomínio Brasil. E no caso, precisamos bastante de você. Falta pouco tempo para decidirmos quem será o síndico nos próximos 4 anos e a gente não consegue nem falar muito bem dos problemas que a gente precisa resolver.





Senta aí que vou te contar:


O condomínio está em frangalhos. Falta água, energia frequentemente, zero acessibilidade, sem sinal de wifi em lugar nenhum e com as taxas cada vez mais caras e serviços cada vez mais escassos como nunca foi na história.


O síndico atual é incompetente, não escuta e não quer nada além do que permanecer onde está. Imagino então que você vai me perguntar quais são os outros candidatos. Já que o atual é tão ruim, precisamos só escolher outro, não é mesmo? Bom, é exatamente aí que está o problema. No condomínio Brasil nada é tão simples.


Sobre os outros candidatos, nada muito novo, mas um síndico antigo, por exemplo, é candidato. Sua lembrança é de uma boa gestão. Por mais que não tenha enfrentado o problema da energia na sua época, ou nem compreenda bem a necessidade da rede de wifi nos tempos de hoje, sua boa administração passada mostra que é possível confiar e ajudar ele a resolver os nossos problemas. Ele, inclusive, já conta com os seus antigos amigos e até gente nova, que ouviu sobre as boas lembranças. Alguns dizem que é o favorito.


Porém, algo de diferente existe neste condomínio. Um terço dos moradores continuam apoiando o atual síndico, mesmo olhando o desastre que vem sendo a sua gestão. Os motivos são variados e ainda temos dúvidas sobre alguns:


A família do 220 mudou da água pro vinho, alguns suspeitam que desviam parte das taxas para festas que, inclusive, deixam o pessoal bastante alegre. O povo do 100, 440, 550, adoram. Até o 450, onde até então morava um casal de idosos e seus netos foram nessa. Ali houve uma separação e dizem que foi devido às brigas sobre a votação.


Seu Lúcio, do 310, é barra pesada. Ex-policial, é visto por aí gritando ao telefone. Alguns dizem que é agiota. Ele gosta de tudo em ordem no seu andar e é sempre bem atendido pelo atual síndico. Tem alguns que têm medo, outros, se mudaram para perto porque ali acham mais seguros.


Mas o que pega todo mundo mesmo é o grupo de WhatsApp que o atual síndico criou em paralelo. Depois de uma briga sobre a segurança no condomínio, criaram um grupo à parte e só Deus sabe tudo que é falado ali dentro. Algumas coisas vazam. Fofocas horríveis e mentirosas, quase sempre. Chegou nesses dias até uma dizendo que alguns entregadores estão levando drogas para andar do síndico antigo. Tem gente até que quer impedir que eles subam, todas as entregas teriam que ser tiradas na porta.


Traição, filhos que saem escondidos dos pais, condôminos que se envolvem, tudo ali está é discutido e quase nada ali não passa apenas de suposição. Parte dos que estão ali, principalmente o pessoal mais religioso, acha tudo tão horrendo, que se junta ao atual síndico que sempre diz que é um absurdo.


Os senhores do 130 e 400, que nunca se davam bem e protagonizaram brigas feias agora caminham juntos pela manhã. Essa amizade repentina, no entanto, é mais comentada no condomínio do que o aumento da taxa de manutenção do elevador. Algo muito estranho acontece. Parece que o absurdo se tornou convencional, enquanto outros as pequenas coisas se tornam o principal ponto de debate.


Enquanto o condomínio definha, um grupo vive em um mundo paralelo. Nós aqui, deixamos de nos preocupar com os problemas estruturais da nossa realidade para não deixar que tudo piore de vez.


O momento das eleições, que deveria ser um espaço de debate para a construção da sociedade, tornou-se um palco onde não se discute futuro, mas sim, sobrevivência. Isto nas eleições para a presidência, mas também para as de governador, senador e majoritárias.





No Rio de Janeiro, Freixo lidera, empatado tecnicamente com Cláudio Castro. Aos poucos, quem apostava que o deputado federal retiraria a sua candidatura no decorrer do processo já começa a voltar atrás. Diante da inexistência de projeto, gasto de dinheiro público voltado para fins basicamente eleitorais e distância completa de uma política eficaz para tirar o Estado do Rio do buraco, a pergunta que fica é, qual é a nossa alternativa?


Será um desafio, mas vamos precisar olhar para dois lados nesse ano. O primeiro, é entender como conseguimos conversar com uma população poucas vezes conseguimos sentar à mesa. Como falar de economia, de segurança, ao mesmo tempo que combatemos as mentiras absurdas que as campanhas bolsonaristas produzem e vão produzir ainda neste ano? O segundo desafio será propor projetos que sejam realmente transformadores para a realidade brasileira.


Não será possível ganhar a eleição falando somente sobre a manutenção do Estado democrática de direito. Mesmo que seja o maior dos nossos problemas, falhamos integralmente em educar o povo brasileiro em cidadania. Nós vamos sim precisar falar sobre a alta do preço do gás, do óleo, do pão. Mas vamos precisar ter respostas para perguntas como segurança, como educação moral, como religião e tantos outros assuntos que a extrema-direita finge saber dar. E, ao mesmo tempo, não será uma coluna de duas laudas que vão chegar aos moradores do nosso condomínio. Serão trechos rápidos e curtos, com o poder de penetrar nas discussões a partir das realidades de cada um. Não será um caminho fácil.


Ao mesmo tempo, vamos precisar utilizar de toda a nossa massa crítica e de conhecimento para construir propostas de política pública que realmente signifiquem a retomada dos nossos estados e do nosso país. Não será suficiente discutir ampliação do acesso à renda se não levarmos em conta o desenvolvimento do trabalho na economia da informação. Como também é irrisório pensar em zerar o desmatamento enquanto o mundo se dirige para uma economia verde. No Rio de Janeiro, por exemplo, não será somente falar sobre a rede produtiva de petróleo, vamos precisar revolucionar a nossa estrutura de mobilidade urbana e de envolvimento da comunidade com os espaços públicos, para tentar desmantelar o Estado dominado pela milícia que está sendo construído, cada dia com mais e mais parcerias com quem ocupa os espaços de poder.


No nosso condomínio Brasil, o foco das eleições não será o problema, nem ao menos as soluções. Será quem sabe comunicar melhor, convencer e se identificar com os anseios diversos da população. No entanto, sairemos derrotados, mesmo se vencermos, caso deixemos a oportunidade de discutir o que o Brasil e nossas unidades federativas realmente necessitam. Na política pública, política vem antes, mas não iremos em lugar nenhum sem pensar no Interesse Público.


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