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Foto do escritora palavra solta

Três poemas de Dylan Thomas por Leonardo Marona

Atualizado: 14 de set. de 2020



Não caia gentil nessa noite boa

(Dylan Thomas)

Não caia gentil nessa noite boa,

O velho arde e delira ao fim do dia;

Raiva, raiva contra essa luz que escoa.

Sabendo os sábios que no fim ecoa

O escuro sem raio do que foi dito,

Não caem gentis nessa noite boa.

Os bons choram o brilho sobre a onda,

Com a frágil ação que dança na baía,

Raiva, raiva contra essa luz que escoa.

Os loucos, que pegam o sol em voo

E tarde perdem o sol no caminho,

Não caem gentis nessa noite boa.

Os graves, de olho cego, quase morto,

Têm na cegueira um meteoro e gritam,

Raiva, raiva contra essa luz que escoa.

E tu, meu pai, da tua altura rota,

Xinga, me benze com choro, eu suplico.

Não caia gentil nessa noite boa.

Raiva, raiva contra essa luz que escoa.


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Do not go gentle into that good night

(Dylan Thomas)

Do not go gentle into that good night, Old age should burn and rave at close of day; Rage, rage against the dying of the light. Though wise men at their end know dark is right, Because their words had forked no lightning they Do not go gentle into that good night.

Good men, the last wave by, crying how bright Their frail deeds might have danced in a green bay, Rage, rage against the dying of the light.

Wild men who caught and sang the sun in flight, And learn, too late, they grieved it on its way, Do not go gentle into that good night.

Grave men, near death, who see with blinding sight Blind eyes could blaze like meteors and be gay, Rage, rage against the dying of the light.

And you, my father, there on the sad height, Curse, bless, me now with your fierce tears, I pray. Do not go gentle into that good night. Rage, rage against the dying of the light.







Vinte e Quatro Anos (Dylan Thomas)

Vinte-quatro anos avisam meus olhos das lágrimas.

(Cavar os mortos por medo de que se forcem contra a tumba.)

No arco da passagem natural, feito um alfaiate, me curvo

Costurando pra viagem uma capa

Sob a claridade de um sol carnívoro.

Vestido pro fim, sinto a pompa da libido,

Com as veias rubras cheias de prata,

Na direção derradeira dessa elementar cidade

Avanço enquanto o infinito existe.



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Twenty Four Years (Dylan Thomas)

Twenty-four years remind the tears of my eyes. (Bury the dead for fear that they walk to the grave in labour.) In the groin of the natural doorway I crouched like a tailor Sewing a shroud for a journey By the light of the meat-eating sun. Dressed to die, the sensual strut begun, With my red veins full of money, In the final direction of the elementary town I advance as long as forever is.







Poema em outubro (Dylan Thomas)

Era meu trigésimo ano até o paraíso

Meu ouvido desperto pelo porto e pela floresta vizinha

E pelo grude dos mariscos e pela garça

Bendita costa

A manhã convoca

Com água chorando e clamor de gaivota e gralha

E a batida dos barcos veleiros contra o muro de teias

Eu mesmo me finco

Àquele segundo

Nesta ainda sonolenta cidade então começo.

Meu nascimento começa nos pássaros

D’água e pássaros de árvores aladas voam meu nome

Sobre as fazendas e os cavalos brancos

E me ergui

Num outono chuvoso

E fui pra longe na enxurrada dos meus dias

Maré alta e a garça afundou quando caí na estrada

Sobre a fronteira

E os portões

Da vila cerrada no que a vila acordava.

Uma primavera de cotovias numa nuvem

Rolante e os arbustos da estrada transbordando com o canto

Dos pássaros pretos e o sol de outubro

Estival

Sobre os ombros da colina,

Aqui onde o bom ambiente e doces cantores de repente

Chegam pela manhã por onde eu perambulei e escutei

A chuva entortando

O sopro gelado do vento

Na floresta distante abaixo de mim.

Chuva pálida sobre o porto definhado

E sobre a igreja mareada do tamanho de um caracol

Com seus chifres pela nevoa e o castelo

Marrom-coruja

Mas todos os jardins

Da primavera e do verão floresciam em fábulas irreais

Além da fronteira e sob a nuvem cheia de cotovias.

Ali eu pude desfrutar

Meu aniversário

De cara, mas o tempo virou de repente.

Se afastou da jubilosa província

E caiu num novo ar e no céu azul modificado

Jorrou outra vez a maravilha do verão

Com maçãs

Peras e groselhas vermelhas

E eu vi na virada tão claramente as esquecidas

Manhãs da criança quando ela andava com sua mãe

Através das parábolas

Da luz solar

E das lendas das capelas verdes.

E os duplo-citados campos da infância

Cuja lágrima me queimou o rosto e o coração entrou no meu.

Estes eram a floresta o rio e o mar

Onde um garoto

No verão audível

Dos mortos sussurrou a verdade da sua alegria

Para as árvores e as pedras e o peixe na correnteza.

E o mistério

Cantou vivo

Imóvel na água e no canto dos pássaros.

E ali eu pude desfrutar meu aniversário

De cara, mas o tempo virou. E a verdadeira

Alegria da já morta criança cantou queimando

Sob o Sol.

Era o meu trigésimo

Ano até o paraíso, fiquei lá então na tarde de verão

Embora a vila deitasse frondosa com outubro em sangue.

Ah, possa a verdade do meu coração

Ainda ser cantada

Neste cume na virada de um ano.


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Poem in October (Dylan Thomas)

It was my thirtieth year to heaven

Woke to my hearing from harbour and neighbour wood

And the mussel pooled and the heron

Priested shore

The morning beckon

With water praying and call of seagull and rook

And the knock of sailing boats on the webbed wall

Myself to set foot

That second

In the still sleeping town and set forth.

My birthday began with the water-

Birds and the birds of the winged trees flying my name

Above the farms and the white horses

And I rose

In a rainy autumn

And walked abroad in shower of all my days

High tide and the heron dived when I took the road

Over the border

And the gates

Of the town closed as the town awoke.

A springful of larks in a rolling

Cloud and the roadside bushes brimming with whistling

Blackbirds and the sun of October

Summery

On the hill's shoulder,

Here were fond climates and sweet singers suddenly

Come in the morning where I wandered and listened

To the rain wringing

Wind blow cold

In the wood faraway under me.

Pale rain over the dwindling harbour

And over the sea wet church the size of a snail

With its horns through mist and the castle

Brown as owls

But all the gardens

Of spring and summer were blooming in the tall tales

Beyond the border and under the lark full cloud.

There could I marvel

My birthday

Away but the weather turned around.

It turned away from the blithe country

And down the other air and the blue altered sky

Streamed again a wonder of summer

With apples

Pears and red currants

And I saw in the turning so clearly a child's

Forgotten mornings when he walked with his mother

Through the parables

Of sunlight

And the legends of the green chapels

And the twice told fields of infancy

That his tears burned my cheeks and his heart moved in mine.

These were the woods the river and the sea

Where a boy

In the listening

Summertime of the dead whispered the truth of his joy

To the trees and the stones and the fish in the tide.

And the mystery

Sang alive

Still in the water and singing birds.

And there could I marvel my birthday

Away but the weather turned around. And the true

Joy of the long dead child sang burning

In the sun.

It was my thirtieth

Year to heaven stood there then in the summer noon

Though the town below lay leaved with October blood.

O may my heart's truth

Still be sung

On this high hill in a year's turning.






DYLAN THOMAS (1914-1953) foi um poeta galês. Em 1934, quando Thomas tinha vinte anos, mudou-se para Londres, ganhou o prêmio Poet's Corner. O livro era uma coleção de cadernos de poesia que Thomas tinha escrito anos antes, assim como muitos de seus livros mais populares. Durante este período de sucesso, Thomas começou também o hábito de abuso de álcool.

Ao contrário de seus contemporâneos, Thomas Stearns Eliot e W.H. Auden, Thomas não estava preocupado com a exibição de temas de questões sociais e intelectuais, e sua escrita, com o seu lirismo intenso e altamente carregada emoção, tem mais em comum com a tradição romântica. Seus poemas demonstravam influências célticas, bíblicas e do surrealismo inglês.

Aos 35 anos, em 1950, o poeta visitou os Estados Unidos pela primeira vez. Teatral, romântico e dado a porres homéricos, ele se tornou uma figura lendária nos EUA e isso ajudou sua divulgação para o mundo. Thomas tornou-se um ídolo para a geração dos poetas da chamada Geração Beat.

Morreu de alcoolismo, aos 39 anos. Consta que, no dia de sua morte, já com sérios problemas de saúde, ele teria ingerido 18 doses de uísque, tendo caído do Chelsea Hotel, em Nova Iorque e morrido no hospital alguns dias depois. Está enterrado numa campa na Saint Martin’s Church, Laugharne, Carmarthenshire, Gales. A sua esposa, que lhe sobreviveu 40 anos, está enterrada ao seu lado.



Leonardo Marona é poeta. Publicou os livros: Pequenas biografias não-autorizadas (poesia, 7Letras, 2009); l'amore no (poesia, 7Letras, 2011); Conversa com leões (contos, Oito e meio, 2012); Óleo das horas dormidas (poesia, Oficina Raquel, 2014); Cossacos Gentis (romance, Oito e meio, 2015); Herói de Atari (poesia, Garupa Edições 2017); Dr. Krauss (novela, Oito e meio, 2017); Uma baronesa às quatro da madrugada (poesia, Ed. Urutau, 2018). Atualmente vive no Rio de Janeiro e traduz Shakespeare (Ricardo III) e alguns poetas da Geração Beat.

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