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Foto do escritora palavra solta

Pérola Escondida: disco de Nelson Angelo e Joyce completa 50 anos

por Pérola Mathias



Nelson Ângelo e Joyce (1972)




Em 2022, alguns dos principais álbuns da discografia brasileira estão completando 50 anos. Costuma-se dizer por aí, inclusive, que o ano de 1972 teria sido o mais importante da nossa música. Será? A verdade é que todo o início da década de 1970 foi brilhante para nós, pois as gravadoras gozavam de um momento auge do mercado fonográfico, em que a alta venda de discos e o orçamento cheio de que passaram a dispor fomentava circuitos, novos artistas e dava liberdade para os compositores que já estavam circulando há um tempo.


Dentre os discos mais celebrados de todos os tempos e que completam agora meio século de existência sem nunca ter sumido das paradas estão “Transa”, de Caetano Veloso; “Expresso 2222”, de Gilberto Gil, “Acabou Chorare”, dos Novos Baianos (Viva Galvão! Viva Moraes!); “Clube da Esquina”, Milton Nascimento e Lô Borges; “Elis”, de Elis Regina; “A Dança da Solidão”, Paulinho da Viola; o 3º disco homônimo de Tim Maia.


Dentre a safra de 72, um disco nem tão lembrado, mas que deveria constar nas listas, é “Nelson Ângelo e Joyce”, lançado pela Odeon. O compositor e violonista mineiro e a compositora e violonista carioca formavam, então, um casal. Ela já somava discos solo desde 1968; ele, desde 1970, quando gravou com Luiz Eça e a Sagrada Família no México.


Joyce vinha de uma aproximação com a Bossa Nova e Ângelo integrava o famoso Clube da Esquina. O disco deles traz a leveza de ambas origens musicais e um clima um tanto bucólico que só a música de Minas Gerais foi capaz de produzir. Ouvir as 13 (TREZE!) faixas que o compõem é garantia de paz para a alma e, se você fechar bem os olhos, de uma imersão na natureza, mesmo estando longe dela. Os destaques, além da voz doce de ambos, é o diálogo entre os violões e a percussão. Mas não é só isso.


O disco contou com um time de peso no instrumental e nas vozes auxiliares. Também cantam os mineiros Beto Guedes e o recifense Novelli. Os pianos são conduzidos por ninguém menos que Tenório Jr. e Toninho Horta. Esse último também integra o time de primeira da percussão, ao lado de Rubinho, Robertinho Silva e Hélcio Milito na bateria. As flautas são presenças fundamentais e foram tocadas por Paulo Jobim, Danilo Caymmi e Sérgio Fayne. E tem ainda os cellos de Antônio Pinheiro e Edmundo Oliani. O design ficou a cargo da dupla dinâmica Ronaldo Bastos e Cafi, autor, óbvio, das fotos da capa.


Uma das poucas composições que a dupla regrava no álbum é “Hotel Universo”, de Ronaldo Bastos. “Meus vinte anos” é uma parceria de Joyce com o poeta carioca que também foi parte vital do Clube da Esquina e “Vivo ou Morto” foi composta por Danilo Caymmi e João Carlos Pádua. O cheiro de mato que as composições exalam, especialmente em “Cheiro de Fruta” e “Sete cachorros”, se transformam, literalmente, em meditação em “Mantra”. Um certo ar de desbunde se revela na faixa “The man from avenue”.


Em recente matéria da revista The Wire sobre Joyce, com uma entrevista com a compositora, assinada por Joshua Minsoo Kim, Joyce revela que o álbum era para ser um disco apenas de Nelson Ângelo, mas que a pedido da gravadora, na época, foi pedido que ambos assinassem a autoria. No entanto, como disse acima, seu nome só constou no crédito de uma das faixas. Para a matéria, Joyce disse que não considera um de seus grandes trabalhos e que acha seu trabalho mais interessante a partir de “Passarinho Urbano”, que hoje é um dos álbuns mais cults da música brasileira.


É de entender o posicionamento de Joyce, pois é verdade que sua identidade vem à tona com os discos seguintes. Ela e Ângelo tiveram dois filhos. Eles se separaram e, em uma gravação em Nova York, ela conheceu o baterista baiano Tutty Moreno, com quem é casada até os dias de hoje e de quem incorporou o sobrenome.


Apesar de tudo, creio que “Nelson Ângelo e Joyce” seja uma pérola escondida da nossa discografia e deveria constar nas listas dos grandes álbuns de 1972. É só deixar o ambiente à meia luz, acender um incenso e desfrutar do som. Em “Tiro Cruzado” dá até para dançar.


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