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Entrevista com Caleb Hahne-Quintana

por Pollyana Quintella



Oriundo de uma família mexicana, Caleb Hahne-Quintana (1993) nasceu em Denver, no Colorado, e atualmente mora em Nova Iorque. Sua obra pictórica, de cunho afetivo e autobiográfico, explora memórias e origens ancestrais através de personagens – sobretudo masculinos – em situações que conferem um senso de integração com o ambiente circundante e a natureza de forma geral. A luz, elemento de grande importância na sua pintura, é responsável por produzir uma atmosfera nostálgica e idealista, transformando eventos banais em situações graciosas. Conversei com Caleb por e-mail a respeito de sua trajetória, a negociação da sua identidade no contexto americano e algumas questões importantes de sua produção. A conversa segue abaixo na versão original e na tradução para o português.


@calebhahne



“Limpia”, Oil, acrylic and wax on canvas, 60 x 72 in, 2021



P: Can you tell me a little bit about yourself? Your family is Mexican and you grew up in rural Colorado, is that it?


C: Yes, my mothers side is Mexican. Growing up my family always claimed to be from Spain but all of our traditions were Mexican so I questioned being Spanish my whole life. I always thought, “Spanish people don’t make tamales and menudo, they don’t have quinceaneras and mariachi bands play at Christmas.” Even the way we spoke Spanish in my house was “Mexican”. So earlier this year I started digging into my family's records and history and found out that my great great grandfather, Casemiro, immigrated from Mexico to New Mexico then finally to southern Colorado in the early 1900’s.

I think the story of assimilation is more common than not. My grandmother and all her brothers and sisters didn’t speak much English until they were teenagers and so I believe that claiming to be European was a way of protection - especially since my family is so fair skinned it seems that this was a bit of armor so to speak. I think being Mexican or brown in the mid 1900’s United States was a bit more complicated than it is now. For me, taking my family's last name, Quintana, is a way of reclamation. To carry the torch. To speak to Casemiro. To disallow the erasure of our history, our pilgrimage.



P: Você pode me contar um pouco sobre você? Sua família é mexicana e você cresceu na zona rural do Colorado, é isso?

C: Sim, meu lado materno é mexicano. Minha família alegava ser da Espanha, mas todas as nossas tradições eram mexicanas, então eu questionei ser espanhol toda a minha vida. Eu sempre pensei: “os espanhóis não fazem tamales e menudo, eles não têm quinceaneras e bandas de mariachi no Natal”. Até a forma como falávamos espanhol na minha casa era “mexicano”. Então, no início deste ano, comecei a pesquisar os registros e a história da minha família e descobri que meu bisavô, Casemiro, emigrou do México para o Novo México e, finalmente, para o sul do Colorado no início de 1900.

Acho que a história da assimilação é mais comum do que o contrário. Minha avó e todos os seus irmãos e irmãs não falavam muito inglês até a adolescência e por isso acredito que afirmar ser europeu era uma forma de proteção – especialmente porque minha família tem pele clara, o que parecia uma espécie de armadura de proteção, por assim dizer. Acho que ser mexicano ou pardo em meados de 1900 nos Estados Unidos era um pouco mais complicado do que é agora. Para mim, adotar o sobrenome da minha família, Quintana, é uma forma de reivindicação. Para carregar a tocha. Para falar com Casemiro. Para não permitir o apagamento de nossa história, nossa peregrinação.




The Other Side Is The Day (self portrait in blue), 48 x 60 in, Oil, Acrylic and wax on canvas, 2021



P: Do you consider your work autobiographical? Once the episodes of your life are painted, do you believe they become more collective?


C: Absolutely. For a long time I felt like I needed to make art about art. I was waiting for someone to give me permission to tell my story. My paintings are about me and the people in it. Being white passing and growing up in predominantly black and brown communities (including my own home) I always searched for belonging. Belonging is a destination. It’s a state of being- both a noun and a verb. For me, reaching belonging first meant meeting myself and giving me the permission I wanted. When I think about an exhibition, I want all of the people in the paintings to have some sort of relationship to one another; I want them all to connect back to me. If you think about a family tree for a second - how two people exist in the same bloodline, though on opposite sides of the roots. Ultimately, they all come back to one. I like to think of my paintings operating in a similar way, distinct, but a part of this oneness.



P: Você considera seu trabalho autobiográfico? Uma vez que os episódios de sua vida são pintados, você acredita que eles se tornam mais coletivos?


C: Absolutamente. Por muito tempo senti que precisava fazer arte sobre arte. Eu estava esperando que alguém me desse permissão para contar a minha história. Minhas pinturas são sobre mim e as pessoas que aparecem nelas. Tendo passabilidade branca e crescendo em comunidades predominantemente negras e pardas (inclusive na minha própria casa) sempre busquei pertencimento. Pertencer é um destino. É um estado de ser - tanto um substantivo quanto um verbo. Para mim, alcançar pertencimento significava primeiro me encontrar e me dar a permissão que eu queria. Quando penso em uma exposição, quero que todas as pessoas nas pinturas tenham algum tipo de relação umas com as outras; eu quero que todas elas se conectem de volta comigo. É como pensar numa árvore genealógica por um segundo -- duas pessoas podem existir na mesma linhagem, embora em lados opostos das raízes. Em última análise, todas elas correspondem a um só começo. Gosto de pensar em minhas pinturas operando de maneira semelhante, distinta, mas parte dessa unidade.




“Instar", 72 x 55 in, Oil, acrylic, flashe and wax on canvas, 2021



P: Light is very important in your painting. It is responsible for bringing an atmosphere that is sometimes nostalgic and ideal, characteristic of the reveries of memory and the universe of childhood. Your characters seem lit up by a sunrise or a sunset. What interests you with these procedures?


C: I’ve always loved light. I always loved its ability to be both felt and seen while also being phantom. Light allows my paintings to be felt; like when it pierces through your fingertips or the back of your ears, making you translucent- a body of blood and bone, a body of feeling and thought. Light places you in the field, in the ocean and in the room. Nothing else can do that for you but the sun and moon. I make paintings about childhood because it was terrifying for me. I make paintings to set myself free. I make paintings to tell a story most of us have heard or belonged to.




P: A luz é muito importante na sua pintura. Ela é responsável por construir uma atmosfera por vezes nostálgica e ideal, própria dos devaneios da memória e do universo da infância. Seus personagens parecem iluminados por um nascer do sol ou um pôr do sol. O que te interessa nesses procedimentos?


C: Eu sempre amei a luz. Sempre amei sua capacidade de se fazer sentida e vista embora seja fantasmagórica. A luz permite que minhas pinturas sejam sentidas; como quando atravessa a ponta dos dedos ou a parte de trás das orelhas, tornando-as translúcidas - um corpo de sangue e osso, um corpo de sentimento e pensamento. A luz coloca você no campo, no oceano e na sala. Nada mais pode fazer isso por você, a não ser o sol e a lua. Faço pinturas sobre a infância porque foi aterrorizante para mim. Faço pinturas para me libertar. Faço pinturas para contar uma história que a maioria de nós já ouviu ou pertenceu.




Window (New York), 50 x 50 in, Acrylic on canvas, 2020



P: You're half Latino, but considerably white-passing. How do you see the negotiation of your identity in the American art scene today? Also, how does your childhood in rural Colorado inform your painting?


C: I struggle with this every day. I feel more pressure to prove that I belong and I think this is where my feelings around permission are spawned; waiting for someone to let me know I’m one of them and allowed to speak on behalf of my experience. Whenever I meet other Mexicans I always feel a weird need (that I place on myself) to let people know who I am and where I’m from. I think a lot of this comes from my family calling me their “Guero” (white boy) my whole life. I love it, but it’s interesting to think about how a word can both bring you in and kick you out at the same time. To remind me that I am both one of them but also not simultaneously. I will never claim to understand what it’s like to be a person of color because I am not, but what I do know is being a child and seeing my family spoken to in Spanish in stores because they thought we didn’t speak English, or words used against my family for the color of their skin while I stood next to them, pale faced with rosy cheeks, or the countless times I’ve said “I’m Mexican” and someone saying “no you’re not” then pulling out a picture of my family as proof. Belonging is a destination we are always trying to reach.


I think my relationship with being half of something is that I always felt full. My mother and father were never married but she did marry my step father, who is also Mexican, so that adds another layer to my story. I didn’t see my biological father often as a kid so the two families I saw predominately were my mothers and step fathers, both brown, both Mexican, with me in the middle, feeling half of both at all times, making me feel full. I don’t really know what it means to have had a “white” childhood outside of my skin and name because of this. I find it interesting how we use terms like quarter, half or full to define our genetic makeup, as if we’re baking a cake. I don’t find those measurements as important as truth. My truth is that despite my name and skin, the houses I grew up in are what made me, what taught me, what brought me to this interview, because for so many of us we want to be full despite everything I’m discussing.


I didn’t realize how special Colorado was until I moved to New York. I always loved being from Aurora/Denver, but when I got to a big city I began reflecting on the blessing that was watching people ride horses in my neighborhood, the ringing of the tamale cart outside the Arc on west Colfax, the countless orange and blue Broncos football flags and license plates I saw everywhere, green chili and the way someone says “huh bud” after they ask you a question. All of those things impact the way I see the world which ultimately impacts the way I paint.





P: Você é meio latino, mas tem considerável passabilidade branca. Como você vê a negociação de sua identidade no cenário artístico americano hoje? Além disso, como sua infância no Colorado rural influencia sua pintura?


C: Eu luto com isso todos os dias. Me sinto pressionado em provar uma espécie de pertencimento e acho que é aí que surge um sentimento de autorização; esperando que alguém me diga que sou um deles e tenho permissão para falar em nome da minha experiência. Sempre que conheço outros mexicanos, sinto uma necessidade estranha (que coloco sobre mim mesmo) de que as pessoas saibam quem sou e de onde venho. Acho que muito disso vem da minha família me chamar de “Guero” (menino branco) a vida toda. Eu gosto disso, mas é interessante pensar como uma palavra pode traduzir você e expulsá-lo ao mesmo tempo. Me faz lembrar, simultaneamente, que sou e não sou um deles. Eu nunca vou dizer que entendo o que é ser uma pessoa de cor porque eu não sou, mas quando criança eu via minha família falar espanhol nas lojas porque eles achavam que não falávamos inglês, e ouvia palavras usadas contra eles pela cor de sua pele enquanto eu estava ao seu lado, de rosto pálido com bochechas rosadas; ou as inúmeras vezes que eu disse “sou mexicano” e alguém disse “não, você não é”, até eu mostrar uma foto da minha família como prova. Pertencer é um destino que estamos sempre tentando alcançar.

Acho que minha relação com ser metade de algo é o que me faz sentir pleno. Minha mãe e meu pai nunca se casaram, mas ela se casou com meu padrasto, que também é mexicano, então isso adiciona outra camada à minha história. Eu não via meu pai biológico com frequência quando criança, então as duas famílias que eu via predominantemente eram minhas mães e meus padrastos, ambos castanhos, ambos mexicanos, comigo no meio, me sentindo metade de ambos o tempo todo, fazendo-me sentir completo. Eu realmente não sei o que significa ter uma infância “branca” fora da minha pele e nome por causa disso. Acho interessante como usamos termos como quarto, metade ou cheio para definir nossa composição genética, como se estivéssemos assando um bolo. Não acho essas medidas tão importantes quanto a verdade. A minha verdade é que apesar do meu nome e da minha pele, as casas em que cresci são o que me fizeram, o que me ensinou, o que me trouxe a esta entrevista, porque para muitos de nós queremos estar cheios apesar de tudo o que estou a discutir.

Eu não percebi o quão especial o Colorado era até me mudar para Nova York. Sempre adorei ser de Aurora/Denver, mas quando cheguei a uma cidade grande comecei a refletir sobre a bênção que era ver as pessoas andando a cavalo no meu bairro, o toque da carroça de tamales do lado de fora do Arc em Colfax oeste, as incontáveis ​​luzes laranja e bandeiras de futebol azul dos Broncos e placas de carros que eu via em todos os lugares, o pimentão verde e o jeito que alguém diz “huh bud” depois de fazer uma pergunta. Todas essas coisas afetam a maneira como vejo o mundo, o que acaba afetando a maneira como pinto.




“Fire Lily”, 18 x 14 in, Oil, acrylic and flashe on canvas, 2021



P: Do the images of the paintings all come from memory or do you consult some photographic sources?


C: A little bit of both. I take a lot of pictures and resource others and then collage everything to build a composition. Most of the time I’ll have a series of images floating through my head that need to become something and eventually I find the right set of images that need to go together.




P: As imagens que vemos nas obras vêm todas da sua memória ou você consulta algumas fontes fotográficas?


C: Um pouco dos dois. Eu tiro muitas fotos, recorro a outras e depois edito tudo para construir uma composição. Na maioria das vezes, tenho uma série de imagens flutuando na minha cabeça pedindo para se tornar algo e, eventualmente, encontro o conjunto certo de imagens que precisam andar juntas.





P: How do the water glass paintings relate to the recent wildfires in California and Colorado?


C: I started making the water glass paintings at a residency in Los Angeles and while I was there, both Colorado and California were having raging wildfires that were turning the sky gray and umber. Colorado and California are also in a drought and was thinking about the relationship between water and fire -- waters ability to be life and fires ability to take it. A dance between the two- like sun and moon.





P: Como as pinturas de copos d'água se relacionam com os recentes incêndios florestais na Califórnia e no Colorado?


C: Eu comecei a fazer as pinturas de copo d'água em uma residência em Los Angeles e enquanto eu estava lá, tanto o Colorado quanto a Califórnia estavam tendo incêndios violentos que deixavam o céu cinza e escuro. Colorado e Califórnia também estão atravessando uma seca e eu pensei na relação entre a água e o fogo – a capacidade da água de ser vida e a capacidade do fogo de tomá-la. Uma dança entre os dois, como o sol e a lua.




“Eclipse”, 72 x 60 in, Oil, acrylic, flashe and wax on canvas, 2021



P: In many cases, faces are obscured or unimportant. Why?


C: I was hesitant to put faces in my paintings for a long time because I felt like it didn’t allow people to see themselves as the person in the painting or be a part of it. Quang (my gallerist/mentor/friend) told me the gift of my paintings is their sincerity; you have to earn your place in them. If I placed faces in all of my paintings, you would start to feel maybe less involved as a part of them and more as a voyeur.





P: Em muitos casos, você opta por manter os rostos obscurecidos ou sem importância dentro da composição. Por quê?


C: Eu hesitei em colocar rostos em minhas pinturas por muito tempo porque eu sentia que isso não permitia que as pessoas se vissem como a pessoa na pintura ou fizessem parte dela. Quang (meu galerista/mentor/amigo) me disse que o presente de minhas pinturas é sua sinceridade; você tem que conquistar seu lugar nelas. Se eu colocasse rostos em todas as minhas pinturas, você começaria a se sentir menos envolvido como parte delas e mais como um voyeur.




“Morning Sun”, 24 x 24 in, Acrylic on canvas, 2020



P: And last but not least, which other artist of our generation would you recommend to me?


C: This is tough but I think the people that are constantly pushing me are: Anthony Cudahy, Lenz Geerk, Julien Nguyen, Claire Tabouret, Maria Fragoso, Enrique Martinez Celaya, Hernan Bas





P: E por último, mas não menos importante, que outro artista da nossa geração você me recomendaria a conhecer?


C: Difícil, mas acho que as pessoas que estão constantemente me interessando são: Anthony Cudahy, Lenz Geerk, Julien Nguyen, Claire Tabouret, Maria Fragoso, Enrique Martinez Celaya, Hernan Bas


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