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5a1_entrevista Joyce Trindade

por A Palavra Solta


Fotografia: Maria Morgado/A Palavra Solta


Joyce Trindade, secretária municipal de Políticas e Promoção da Mulher da cidade do Rio de Janeiro

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APS – Apesar de já ocupar o cargo de secretária municipal, sua trajetória na política institucional ainda é muito recente. Como foi o início da sua militância, o trajeto até à Secretaria de Políticas e Promoção da Mulher, e de que forma você lê essa formação de um secretariado mais jovem por parte do prefeito Eduardo Paes?


JT - Desde muito cedo vivenciei as desigualdades da cidade. Nasci em Padre Miguel e fui criada em Cosmos, na profunda Zona Oeste, onde o olhar do Estado não chegava. Desde muito nova dizia que gostaria de trabalhar para transformar o meu bairro. Sou filha de uma mulher negra e um migrante nordestino que me ensinaram a sonhar.


Um grande direito que tive acesso e que, infelizmente, muitos de onde venho não tiveram, foi justamente o de sonhar.


Meus pais sonharam que eu entraria na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), que seria uma agente de transformação e levaria o nome da Zona Oeste, das mulheres negras e do meu povo, para a centralidade da discussão da cidade. Fui a primeira da família a ingressar em uma universidade pública, graças às políticas de ações afirmativas e auxílios estudantis. Quando comecei a faculdade, as desigualdades da cidade ficaram ainda mais gritantes no meu cotidiano. Cruzar essa cidade partida me ensinou muito sobre quem eu queria ser e que jamais esqueceria de onde eu vim. E o mais importante, que eu tinha a responsabilidade coletiva de construir pontes para que mais pessoas como eu pudessem acessar espaços de decisão.


Na universidade conheci mais de perto os movimentos sociais e a gestão pública, dois ingredientes que fazem parte da minha forma de construir política. Ouvir a base, conhecer os problemas sociais, acreditar na potência do povo, das pessoas que se organizam e lutam para que ninguém fique para trás. Organizar, planejar, otimizar os recursos públicos, articular para que a criação de políticas efetivas e o trabalho em rede aconteçam.


Foi assim que em 2018, meus amigos e eu, todos estudantes de gestão pública e oriundos das diferentes periferias da região metropolitana, nos juntamos para fundar o projeto Manivela. Um projeto que atuou para levar a gestão pública para dentro das favelas do Rio de Janeiro, sendo ponte entre as lideranças comunitárias e o Estado. Além disso, atuei em diferentes frentes, sempre tendo a pauta das mulheres, dos negros e da periferia como norte da construção de uma nova proposta de governar e criar políticas públicas. Coordenei a pasta de mulheres do Centro Acadêmico da UFRJ, fiz parte Laboratório de Ação Política do mandato da vereadora Marielle Franco, fiz parte do Núcleo de Gestão Estratégica da Prefeitura de Niterói e atuei na República.org, onde participei da criação de uma rede potente de gestores públicos que acreditam na importância dos governos e fui responsável pela criação da campanha nacional “Onde estão os Negros no Serviço Público?”. Também sou uma das fundadoras do podcast Expresso 2222, que tem o propósito de discutir a pauta racial no serviço público brasileiro.


O prefeito Eduardo Paes é um grande engenheiro de pessoas e futuros. Criou um time diverso, trouxe uma juventude que vivenciou diversas realidades para provocar o imaginário da gestão pública carioca, além de impulsionar novas lideranças na construção de futuros para a cidade. Como também, pessoas experientes que orientam e possuem a vivência dos desafios da administração pública. Na Secretaria de Políticas e Promoção da Mulher temos a missão de trabalhar com toda a Prefeitura, tornando a pauta da mulher e de gênero uma das principais estratégias de combate às desigualdades e de desejo de uma cidade inclusiva, como também, alinhada com as agendas internacionais que todas as grandes capitais mundiais estão construindo. Até porque, fazer o Rio voltar a dar certo, será a partir de muito trabalho e comprometimento com as diferentes realidades que compõem o nosso Rio de Janeiro.


APS - O projeto Mulher Cidadã tem como objetivo mapear zonas vulneráveis e ocupa-las com projetos sociais e bibliotecas itinerantes os locais onde há maior taxa de feminicídio e violência doméstica. Nos conte um pouco mais sobre esse projeto e quais seus objetivos viáveis.


JT - O projeto Mulher Cidadã visa conectar mulheres que desejam compartilhar seus conhecimentos com outras mulheres, formando uma verdadeira rede de trocas e aprendizado, com local de atuação em diferentes equipamentos públicos.


Além disso, é uma forma de expandir a nossa atuação pelos territórios da cidade e aproximar os serviços oferecidos pela SPM-Rio das regiões com menor índice de desenvolvimento humano (IDH) e maiores índices de violências contra a mulher, facilitando o encaminhamento destas mulheres para atendimentos psicossociais e jurídicos.


Atualmente, temos duas salas abertas, mas nosso objetivo é chegar a dezesseis salas até o final da gestão. Mais de 150 voluntárias já se cadastraram para oferecer oficinas gratuitas e mais de 500 inscrições já foram realizadas em oficinas de empreendedorismo, bem-estar, direitos e outros temas.


Fotografia: Maria Morgado/A Palavra Solta


APS - De que forma essas mulheres chegam até o projeto, tendo em vista que há situações em que são monitoradas por seus cônjuges e vivem um ciclo de completo controle?


JT - Buscamos oferecer atividades diversas, cursos e oficinas que facilitem a aproximação desta mulher. Ela não está entrando em uma delegacia ou um lugar que remete a denúncia dos seus companheiros. Isso facilita muito que elas possam se aproximar e buscar ajuda.


APS - A pandemia trouxe uma realidade ainda mais amarga às mulheres, já condicionadas a duplas e triplas jornadas: fechamento das creches e escolas, explosão da violência doméstica e do feminicídio, além de uma expressiva saída do mercado de trabalho, em parte explicada pelo contingente feminino compor principalmente os setores de comércio e serviços, em um processo que retrocedeu a participação de mulheres no mercado de trabalho aos menores índices desde os anos 90.


Diante deste alarmante quadro de sobrecarga, violência e desemprego femininos, quais são as políticas públicas da Secretaria da Mulher do Rio para fazer o enfrentamento e como essas vêm sendo desenvolvidas?


JT - Essa é uma realidade urgente e desafiadora. Por isso, desde os primeiros meses de gestão temos nos reunido com as demais secretarias, com organismos sociais e empresas privadas para traçar estratégias conjuntas de atuação.


Atualmente, contamos com o Programa Mulheres do Rio, que funcionará como um grande guarda-chuva de ações voltadas para capacitação e empregabilidade de mulheres. Mais de 20 mil mulheres já se cadastraram e mais de 220 foram encaminhadas para vagas de emprego ou capacitação. Sabemos que precisamos acelerar e por isso estamos fechando parcerias com grandes empresas para que essas oportunidades possam se multiplicar.


Neste mesmo guarda-chuva, criamos o projeto Mulheres Trans de Negócio que irá capacitar mulheres trans em temas de Empreendedorismo e Negócios, potencializando suas ideias, produtos e serviços. O projeto, que iniciará ainda no segundo semestre de 2021, também oferecerá uma bolsa para as mulheres participantes. Como também o curso "Mulheres programadoras", que irá capacitar 30 mulheres, no projeto piloto, com aulas de programação avançada e inglês, com o intuito de inserir mais mulheres nas áreas da tecnologia.


Um outro avanço importante é a criação dos centros de referências de atendimento à mulher, possibilitando o atendimento com psicólogas, advogadas e assistentes sociais em mais territórios da cidade, em especial os que possuem alto índice de violência.


Trabalhamos disseminando dados que mostram a potência das mulheres no mercado de trabalho e os benefícios de times mais diversos. Empregar mulheres é uma responsabilidade social, com o agora e o futuro, mas é também uma oportunidade para empresas que querem ser mais competitivas e dialogar com uma sociedade que cada vez mais pressa por inclusão e diversidade.


APS - Em quase 6 meses de secretaria, como você avalia a dificuldade de pensar e articular políticas públicas como ferramenta de emancipação feminina, sobretudo das mulheres negras? Quais os maiores entraves da prática política?


JT - Um dos maiores desafios está nos tempos de planejamento, organização, articulação e execução. O prefeito Eduardo Paes estimula a prática de uma gestão pública ágil e efetiva. A gente não para! Mas tem os tempos da burocracia, que são maiores que uma gestão. Muitas vezes eles são necessários para garantir que tudo esteja correndo de forma correta com os recursos do povo. Por outro lado, a realidade que enfrentamos é urgente!


Além disso, apesar dos avanços dos últimos anos no debate racial no Brasil e no mundo, ainda enfrentamos questões básicas. Ainda estamos lutando pelo direito à vida das mulheres negras, de não morrermos nas ruas e nas nossas casas.

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